quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Limitação na rotação do ombro – problema capsular ou muscular? – estudo de caso clínico

Hoje em dia assume-se que a etiologia da síndrome do conflito sub-acromial no ombro é multifatorial. Os fatores mecânicos que potencialmente contribuem para esta patologia são:
  • Alterações no controlo neuromuscular
  • Diminuição da força da coifa dos rotadores e músculos peri-escapulares
  • A morfologia e postura do acrómio
  • Rigidez da cápsula articular posterior

Entre estas disfunções, os autores deste estudo de caso concentraram-se na análise da retração da cápsula posterior, que pode ser confirmada clinicamente por uma limitação na adução horizontal e na rotação interna do ombro.


De um ponto de vista clínico vários autores demonstraram que existe uma estreita correlação entre a perda de adução horizontal e a limitação da rotação interna. A relação entre estas duas é que as limitações de 1cm da adução horizontal correspondem a uma redução de 4º de rotação interna.

Num estudo sobre artrocinemática glenoumeral, verificou-se que a redução cirúrgica da cápsula posterior causou uma translação “anormal” em sentido antero-superior durante a flexão do braço. Recentemente, começou-se a suspeitar que este mecanismo de translação “anormal” também é um dos fatores indutores não só para o conflito sub-acromial, mas também para as lesões no labrum glenóideo superior em atletas de voleibol, ténis, natação, etc.

Este estudo de caso clínico nasceu da dúvida dos autores sobre se a limitação na rotação interna do ombro poderia ser apenas causada por uma retração da parte posterior da cápsula, ou esta limitação poder ter um componente muscular, mais ou menos significativo, nomeadamente contracturas nos músculos infra-espinhoso e redondo menor.

Apresentação de caso clínico

  • Homem, de 42 anos, trabalhador braçal, veio a consulta com queixas de dor no ombro direito, que se mantinham há já 12 semanas. O início dos sintomas foi insidioso.
  • A dor era intermitente e causada/agravada por mover o braço além dos 90º de elevação ou por dormir sobre o lado direito. A intensidade da dor nunca foi tão forte a ponto de interferir com as atividades de trabalho e quando sentiu ser necessário o paciente usou AINEs e compressas de gelo para aliviar a dor.
  • Todo o ombro estava doloroso (particularmente na área do deltóide), mas sem dor irradiada. O paciente não sofria de nenhuma dor em redor da área cervical ou no membro superior.
  • Não houve outras descobertas significativas durante qualquer parte da história.
  • O exame não mostrou diferenças no trofismo muscular ou assimetrias posturais significativas. O ritmo escápulo-humeral estava equilibrado, apesar de, no final do movimento haver uma ligeira restrição da elevação à direita, com dor que aparecia no fim do movimento.
  • A avaliação da amplitude de movimento passivo só demonstrou uma limitação da rotação interna do ombro direito em relação ao ombro esquerdo. Testes musculares manuais não revelaram fraquezas, embora a abdução resistida tenha provocado dor.
  • Os testes de impingement foram positivos, particularmente o teste de Hawkins, o teste de Yocum e o teste de compressão ativa de O'Brien.

O diagnóstico de síndrome do conflito subacromial foi confirmado pela sintomatologia do paciente correspondente aos critérios de inclusão/exclusão identificados por diversos autores.

Antes de tratar o paciente, a amplitude de rotação interna foi medida. As medições foram realizadas com um inclinómetro. A força aplicada pelo fisioterapeuta para rodar o braço foi medida com um dinamómetro electrónico ligado ao pulso do paciente. A força utilizada para as medidas pré e pós-tratamento foi idêntica. Foram feitos testes musculares resistidos em abdução, rotação interna e externa, conforme descrito por Cyriax. A força resultante foi medida com um dinamómetro, de modo a usar os mesmos valores para o ensaio de controlo. Por último, foram realizados testes de contusão (Yocum de e Hawkin) e o teste de compressão ativa (O'Brien). Mesmo para estes testes, as forças resultantes foram medidas com um dinamómetro para que pudessem ser reproduzidas exatamente durante os seguintes testes de controlo. 

A dor provocada por estes testes foi medida utilizando uma escala visual analógica (EVA), imediatamente após a conclusão dos testes.

Tratamento

A fim de tratar apenas a parte muscular do ombro, sem afectar a cápsula, o paciente foi colocado de bruços, com o braço seguro a seu lado, numa posição relaxada.

O paciente recebeu uma massagem de 7min no infra-espinhoso e de 3min no redondo menor. Os autores consideram que este tempo de massagem era suficiente para produzir uma alteração no músculo. A massagem foi feita apenas sobre as áreas do infraespinhoso que estavam contraturadas e dolorosas à palpação e sobre a totalidade do redondo menor (devido ao seu tamanho pequeno), movendo-se as pontas dos polegares de uma forma circular. A força aplicada estava relacionada com a capacidade do paciente para suportar a dor.

Todas as medições anteriores foram feitas outra vez no fim de cada tratamento.

O tratamento consistiu em três sessões, dadas em dias alternados. Durante o tratamento o paciente não tomou a medicação ou mudou a sua rotina diária. Além disso, ele não recebeu qualquer outro tratamento ou praticou qualquer exercício em casa.

Conclusão

Após três sessões de tratamento, a amplitude de movimento articular em rotação interna aumentou em 20º.

Na EVA observou-se uma clara melhoria em todos os testes administrados. Na abdução resistida verificou-se uma diminuição do valor inicial de 2,8 para 0, e no teste de Hawkins foi de 3 para 0,3. No teste de Yocum foi de 3 para 0,1 e no de compressão activa de O’brien foi de 2,3 para 0.

Os resultados obtidos no tratamento deste caso clínico mostram como uma restrição na rotação interna do ombro pode ser causada por uma contratura dos músculos posteriores e não exclusivamente por uma rigidez da cápsula posterior.

Este estudo de caso clínico sugere que a massagem dos músculos infraespinhoso e redondo menor pode tornar possível ganhar 20º de rotação interna em pacientes com síndrome do conflito subacromial.


No entanto é, obviamente, necessário fazer estudos sobre um grande número de casos, para confirmar esta hipótese e calcular a incidência do componente muscular versus o componente capsular nestes casos clínicos.



Poser A, Casonato O. Posterior glenohumeral stiffness: capsular or muscular problem? A case report. Man Ther. 2008 May;13(2):165-70.


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